Oficina de Poesia Falada
Criação e Interpretação
De 4 a 8 de março de 2013
São Conrado – Rio de Janeiro – Brasil
maiores informações: portalfulinaima@gmail.com
Exercícios:
1. Concentração:
Mergulhar no texto até que seja possível compreender todo o seu universo dramático. Perceber as nuances de cada verso ou de cada palavra, para a partir daí ter condições de criar uma forma adequada de interpretação através da fala.
2. Respiração:
Respirar calmamente para relaxar antes de cada leitura até sentir o corpo leve, e através da leitura silenciosa, observar espaços rítmicos do texto para melhor executar a respiração dentro desses espaços que devem ser explorados intensamente.
3. Memorização:
Executar a leitura silenciosa até ter certeza que o texto está completamente compreendido em todos os seus códigos e significados. A partir daí, começar a executar uma leitura em voz alta, frente ao espelho de preferência, procurando verificar se verso por verso já está grudado na ponta da língua e na pele da memória.
Textos para Exercícios
Ali
se alice
ali se visse
quanto alice viu
e não disse
se ali
ali se dissesse
quanta palavra
veio e não desce
ali
bem ali
dentro da alice
só alice
com alice
ali se parece
Todo dia é dia D
desde que saí de casa
trouxe a viagem de volta
gravada na minha mão
enterrada no umbigo
dentro e fora assim comigo
minha própria condução
todo dia santo dia
queremos, quero viver
meu coração na bacia
todo dia é dia D
há urubus no telhado
e a carne seca é servida
um escorpião enterrado
na sua própria ferida
não escapa, só escapo
pela porta da saída
todo dia é o mesmo dia
de amar-te, amor-te, morrer
todo dia menos dia
mais dia é dia D
trouxe a viagem de volta
gravada na minha mão
enterrada no umbigo
dentro e fora assim comigo
minha própria condução
todo dia santo dia
queremos, quero viver
meu coração na bacia
todo dia é dia D
há urubus no telhado
e a carne seca é servida
um escorpião enterrado
na sua própria ferida
não escapa, só escapo
pela porta da saída
todo dia é o mesmo dia
de amar-te, amor-te, morrer
todo dia menos dia
mais dia é dia D
Torquato Neto
No meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra
As seis da tarde
as mulheres choravam
no banheiro.
Não choravam por isso
ou por aquilo
choravam porque o pranto subia
garganta acima
mesmo se os filhos cresciam
com boa saúde
se havia comida no fogo
e se o marido lhes dava
do bom
e do melhor
choravam porque no céu
além do basculante
o dia se punha
porque uma ânsia
uma dor
uma gastura
era só o que sobrava
dos seus sonhos.
Agora
às seis da tarde
as mulheres regressam do trabalho
o dia se põe
os filhos crescem
o fogo espera
e elas não podem
não querem
chorar na condução
as mulheres choravam
no banheiro.
Não choravam por isso
ou por aquilo
choravam porque o pranto subia
garganta acima
mesmo se os filhos cresciam
com boa saúde
se havia comida no fogo
e se o marido lhes dava
do bom
e do melhor
choravam porque no céu
além do basculante
o dia se punha
porque uma ânsia
uma dor
uma gastura
era só o que sobrava
dos seus sonhos.
Agora
às seis da tarde
as mulheres regressam do trabalho
o dia se põe
os filhos crescem
o fogo espera
e elas não podem
não querem
chorar na condução
Injúria secreta
suassuna no teu corpo
couro de cor compadecida
ariano sábio e louco
inaugura em mim a vida
pedra de reino no riacho
gumes de atalhos na pedreira
menina dos brincos de pérola
palavra acesa na fogueira
pós os ismos tudo é pós
na pele ou nas aranhas
na carne ou nos lençóis
no palco ou no cinema
a palavra que procuro
é clara quando não é gema
até furar os meus olhos
com alguma cascata de luz
devassa em mim quando transcende
a lamparina que acende
e transforma em mel o que era pus
Não há Vagas
O preço do feijão
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão
O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabem no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras
- porque o poema, senhores
está fechado:
“não há vagas”
Só cabem no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
O poema senhores,
não fede
nem cheira
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão
O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabem no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras
- porque o poema, senhores
está fechado:
“não há vagas”
Só cabem no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
O poema senhores,
não fede
nem cheira
Ferreira Gullar
Direção: Artur Gomes
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