eu te desejo flores lírios brancos margaridas girassóis rosas vermelhas e tudo quanto pétala asas estrelas borboletas alecrim bem-me-quer e alfazema eu te desejo emblema deste poema desvairado com teu cheiro teu perfume teu sabor, teu suor tua doçura e na mais santa loucura declarar-te amor até os ossos eu te desejo e posso palavrarte até a morte enquanto a vida nos procura (artur gomes)
sexta-feira, 1 de março de 2013
Desordem
meu assunto por enquanto é a desordem
o que se nega
à fala
o que escapa
ao acurado apuro
do dizer
a borra
a sobra
a escória
a incúria
o não caber
ou talvez
- pior dizendo –
o que a linguagem
não disse
por não dizer
porque
por mais que diga
e porque disse
sempre restará
no dito o mundo
o por dizer
já que não é da linguagem
dizer tudo
ou é
se se
entender
que
o que foi dito
é o que é
e por isso
nada há mais por dizer
portanto
o meu assunto
é o não dito não
o sublime indizível
mas o fortuito
e possível
de ser dito
e não o é
por descuido
ou por intuito
já que somente a própria coisa
se diz toda
( por ser muda)
é próprio da palavra
não dizer
ou
melhor dizendo
só dizer
a palavra
é o não ser
isto porque
a coisa
( o ser)
repousa
fora de toda
fala
ou ordem sintática
e o dito (a
não coisa) é só
gramática
o jasmim, por exemplo,
é um sistema
como a aranha
( diferente do poema )
o perfume
é um tipo de desordem
a que o olfato
põe ordem
e sorve
mas o que ele diz
excede à ordem
do falar
por isso
que
só
desordenando
a escrita
talvez se diga
aquela perfunctória
ordem
inaudita
uma pera
também
funciona
como máquina
viva
enquanto quando
podre
entra ela ( o sistema)
em desordem:
instala-se a anarquia
dos ácidos
e a polpa se desfaz
em tumulto
e diz
assim
bem mais do que dizia
ao extravasar
o dizer
dir-se-ia
então
que
para dizer
a desordem
da fruta
teria a fala
- como a pera –
que se desfazer?
que de certo
modo
apodrecer?
mas a fala
é só rumor
e ideia
não exala
odor
( como a pera )
pela casa inteira
a fala, meu amor,
não fede
nem cheira
GULLAR,Ferreira, 1930 - "DESORDEM". In: Alguma parte alguma/ ; Apresentação Alfredo Bosi e Antonio Carlos Secchin. 2.Ed. - Rio de Janeiro: José Olympio,2010.p.p. 26, 27, 28, 29, 30
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