eu te desejo flores lírios brancos margaridas girassóis rosas vermelhas e tudo quanto pétala asas estrelas borboletas alecrim bem-me-quer e alfazema eu te desejo emblema deste poema desvairado com teu cheiro teu perfume teu sabor, teu suor tua doçura e na mais santa loucura declarar-te amor até os ossos eu te desejo e posso palavrarte até a morte enquanto a vida nos procura (artur gomes)
segunda-feira, 29 de agosto de 2011
CIDADE NA VIAGEM DO OLHAR
por Almandrade
As cidades são tristes quando uma curiosidade, uma presença, ou um lugar não aquece a solidão de quem vive a abstração da vida cotidiana. Nada tem sentido. A falta sempre remete a uma espécie de deserto que desorienta o viajante solitário de seu próprio espaço. – Será que as cidades deveriam ser habitadas por imagens que desejamos e por imagens poéticas? “Mas o desejo, a poesia, o riso fazem necessariamente a vida deslizar no sentido contrário, indo do conhecido ao desconhecido”. (Bataille) – Enfrentar o desconhecido é uma tarefa difícil para o homem, principalmente quando ele vive em cidades hostis ao mundo do conhecimento.
A publicidade faz a imagem da cidade, como se a natureza fosse uma imitação de uma outra natureza. A arquitetura não é mais arquitetura, é imagem de out-door. A festa faz o paraíso urbano e uma música medíocre anuncia o Carnaval, esta intervenção autoritária que desapropria a vida da cidade, para aqueles que não têm o direito de opinar contra a festa.
A cidade é a multidão que troca de imagem segundo a moda. Mas tem a imagem que permanece na memória, como objeto da paixão para o apaixonado. Pensei em Walter Benjamin e o Diário de Moscou: o olhar apaixonado de um filósofo sobre uma cidade: “Naquela manhã sentia-me com uma energia e por isso consegui falar de maneira sucinta e calma sobre minha permanência em Moscou e sobre suas perspectivas imensamente reduzidas”. Uma relação de paixão compartilhada com o conhecimento das imagens percebidas de uma cidade.
Da janela, contemplei a rua como um voyeur de cidade. O trânsito, a publicidade, a multidão, o centro histórico. Os monumentos e a arquitetura eram objetos para as câmeras fotográficas de turistas, como cenários sem data. Sem a imaginação o passado é a imagem engraçada, um efeito especial do cotidiano, onde tudo é repetitivo. A história, neste caso, não passa de uma mercadoria para um olhar carente de um lazer cultural. “A era faustuosa da imagem e dos astros e das estrelas está reduzida a alguns efeitos de ciclone e terremotos artificiais, de falsas arquiteturas e de truncagens infantis com que as multidões fingem deixar-se empolgar para não sofrer uma decepção amarga demais” (Baudrillard).
Por outro lado, a singularidade de um espaço, de um monumento ou de uma arquitetura fascina o viajante. É como as imagens poéticas que provocam o desejo de olhar e de viver um estado de deslumbramento. As imagens não são totalmente transparentes que se revelam a qualquer olhar sem reflexão: elas provocam a imaginação e exigem um olhar atento, com um repertório de referências. Isto é, uma sensibilidade capaz de perceber nas imagens suas histórias e suas verdades, mesmo que seja uma sensibilidade marcada pela paixão de uma imagem.
Almandrade
Artista plástico, arquiteto, mestre em desenho urbano, poeta e professor de teoria da arte das oficinas de arte do Museu de Arte Moderna da Bahia
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