terça-feira, 30 de agosto de 2011

O delírio é a lira do poeta se o poeta não delira sua lira não profeta



 apocalipse

o fim rimará com o início
e do pó
por amor ou por vício
a vida recomeçará

Poucos são os poetas que podem se encaixar no que acredito como ofício D. E Rodrigo Mebs é um deles, e o poema acima é profecia de uma lira que delira como lira de todo grande poeta. Nos conhecemos em Bento Gonçalves em outubro de 2008, no congresso Brasileirode Poesia e aos poucos comecei a captar sua poesia como fruta farta num pomar de carne e osso.

Em 2009 lá mesmo em Bento Gonçalves vieram as convicções que estava diante de um poeta nato. Estava eu bebendo vinho no Bar Dois Coqueiros, quando vi o Rodrigo passar com um cone que havia seqüestrado do Hotel Vino Cap, onde estávamos hospedados correndo em direção ao chafariz que fica em gente o prédio da Prefeitura.

Reunidos frente ao chafariz já estavam Jiddu Saldanha, Marko Andrade, May Paquetti e Rogério Santos, e entre poemas e delírios estava ali em Bento Gonçalves naquela primavera de 2009 lançado o manifesto Poesia no Cone, e o ditado popular lembra que de médico poeta e louco todos nós temos um pouco, mas para Rodrigo Mebs o poeta tem bem mais.

todo cuidado é pouco
cuidado nunca é demais

de médico e louco
o poeta tem bem mais

Se durante o tempo que durou a manifestação já dava para se ter uma nítida certeza sobre as lâminas poéticas despejadas a pleno pulmões pelo poeta nos tímpanos dos gaúchos que por ali passavam na hora do almoço,  no sábado quando nos preparávamos para arrumar as malas de volta, cada um de nós para a sua cidade, eis que o Rodrigo me surpreende com o convite para seguir com ele e Adília, para Floripa.

Não pensei duas vezes, tirei minha bagagem do ônibus que  nos conduziria até o aeroporto em Porto Alegre, e voltei ao Bar Dois Coqueiros onde ele e Adília aguardavam a minha resposta. Bebemos mais algumas cervejas e algumas horas depois decolamos do Rio Grande com destino a Santa Catarina. Durante o trajeto, Rodrigo e Adília trocavam o volante constantemente e Isabela dormia o sono dos anjos, e eu cuidava do carregamento de cervejas que abastecíamos em cada bar que encontrávamos pela estrada.

passado a limpo

cada

passo
cala um instante
cada vez mais
distante

cada

esboço
fala
mais que a obra
definida

cada salto
abolindo o poço
cada sonho
re(escrevendo)
a vida

E a viagem de 27 horas entre Bento e Gonçalves e Floripa, foi para mim como um passado a limpo, esboço mais que obra definida, estava ali a estrada, a escrita que viria povoar o pensamento durante a temporada inesperada pelas praias catarinenses. Rodrigo como a sua poesia, é carregado de faíscas da surpresa, relâmpagos do inesperado, suas palavras brotam em todas as direções, setas, signos, sílabas cada quais com os seus muitos significados.

horizonte em chamas

fim de tarde                     magnífico
o horizonte arde
o sol se apaga no pacífico


Em Florianópolis foram 7 dias e noites reVirando os versos, os bares, a ilha, as praias, as ruas e praças além de mais uma vez, a visita do inesperado, do outro lado da Ilha da Conceição, onde passamos uma noite sob um manto sagrado de  estrelas e o barulho da água batendo na porta da casa que nos hospedou. Aquela noite do acaso ficou  cravada na pele da memória, como a poesia que Rodrigo falava para os grilos que cantavam até a luz do sol entrar pela fresta das janelas.


Artur Gomes



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